Pio Penna faz um comentário sobre a retirada do Afeganistão
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Pio Penna faz um comentário sobre a retirada do Afeganistão



A Retirada do Afeganistão

Pio Penna Filho

Os países membros da OTAN, tendo à frente os Estados Unidos, decidiram definir um cronograma para a retirada das tropas da Organização do Afeganistão. Por enquanto, está decidido que até o final de 2014 a maior parte do efetivo será retirada e o governo afegão assumirá o controle pleno dos assuntos militares referentes ao país. Pelo menos em tese será assim.
A anunciada retirada das tropas ocidentais do Afeganistão não decorre de um apelo do governo afegão ou do reconhecimento de que a situação política do país está estabilizada e sob controle, ou seja, condizente com os interesses ocidentais (leia-se, dos Estados Unidos e dos seus aliados europeus).
Na verdade, a violência no Afeganistão segue elevada e o controle por parte do governo/tropas de intervenção ainda é por demais precário. O governo só consegue governar uma parte do território do país e as atividades militares dos talibãs permanece. Segundo a ONU, em 2011 foram mais de três mil mortos em decorrência dos embates entre OTAN/Governo e talibãs.
O cerne da questão é que a ocupação do país, que já dura mais de dez anos, está pesando, em termos econômicos e políticos, para os Estados Unidos e os seus aliados. Inicialmente, o principal objetivo era retirar os talibãs do poder e, se possível, esmagar o movimento. A derrubada do governo talibã foi relativamente fácil de ser alcançada, mas a eliminação do grupo e a conversão do Afeganistão a um país condizente com os interesses ?ocidentais? mostrou-se impraticável.
Os Estados Unidos são, de longe, os maiores interessados na questão afegã, afinal de contas a intervenção e ocupação do país faz parte da denominada ?guerra ao terror?. Dos cerca de 130 mil efetivos militares da OTAN no país, 90 mil são tropas norte-americanas. O presidente Obama herdou essa guerra da administração Bush e não teve interesse ou condições de encerrá-la.
Na Europa, principalmente como consequência da crise econômica de 2008/2009 e as mudanças de governos decorrentes da insatisfação popular com os partidos governantes, importantes países começaram a rever sua posição na intervenção do Afeganistão. O caso mais recente é o da França, que anunciou a decisão de retirar, senão todas as suas tropas, pelo menos a maior parte delas até o final deste ano.
Começar uma guerra é relativamente fácil. Difícil é encerrá-la, principalmente quando o inimigo é difícil de ser destruído e se mostra decidido a não se render. Aliás, é justamente isto o que está acontecendo hoje no Afeganistão. Os Estados Unidos não sabem como encerrar essa guerra, uma vez que os talibãs permanecem sendo uma força política e militar considerável e não estão dispostos a abrir mão de suas convicções políticas e religiosas.
 

Uma questão que só o futuro dirá é até que ponto o governo do Afeganistão, moldado e bancado a partir dos interesses ?ocidentais?, terá condições de manter o controle da parte do país que diz governar após a retirada das tropas e do aparato militar da OTAN. Uma coisa, no entanto, é certa: para um país como o Afeganistão, fazer uma previsão para 2014 é uma aposta recheada de incertezas.


* Professor do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília (UnB) e Pesquisador do CNPq. E-mail: [email protected]




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