Pio Penna Filho*
As revoltas populares em partes importantes do mundo árabe seguem adiante, embora em ritmo e intensidade diferentes. Enquanto a situação parece ter se estabilizado no Egito e na Tunísia, distúrbios e guerras prosseguem na Líbia e na Síria.
Uma aspecto que chama a atenção dos analistas que tentam entender a evolução dos acontecimentos na região é o tratamento diferenciado que vem sendo dado pela comunidade internacional para os casos mais violentos. Na Líbia, os países ocidentais, liderados principalmente pelos Estados Unidos, França e Inglaterra conseguiram passar uma resolução no Conselho de Segurança das Nações Unidas autorizando o uso da violência contra o regime do ditador Kadaffi. Já com relação aos acontecimentos na Síria, muito pouco foi feito até o momento para conter um outro ditador, o presidente Bashar Assad.
Estamos assistindo nas últimas semanas a uma escalada na violência política no país. Com destemor, os revoltosos sírios estão enfrentando um dos mais temidos governos do Oriente Médio. Contra os protestos pacíficos, mas decididos, Assad vem utilizando a polícia e as forças armadas com total violência.
Os dados divulgados pela imprensa internacional indicam que, desde março deste ano, mais de 1.300 pessoas já foram mortas pela ação da repressão no país. Esses números, diga-se de passagem, são imprecisos, e a quantidade de mortos pode ser muito maior.
Não existem informações mais precisas porque o governo impõe forte censura e impede a ação da imprensa estrangeira no país. Ademais, as organizações internacionais de ajuda humanitária não podem atuar livremente no país. As informações são, portanto, vagas. O que se sabe é que o governo da Síria tem um histórico de violência contra eventuais opositores e não está para brincadeira, ainda mais depois do que aconteceu na Líbia.
Pela lógica do regime sírio o que aconteceu na Líbia deve ser evitado a todo o custo, ou seja, nenhuma cidade ou região pode cair em mãos de grupos que contestam o regime. Caso isso aconteça as chances de uma intervenção estrangeira, por mais remota que seja, ampliam-se. Não é à toa, portanto, que o emprego intensivo das forças armadas, com a utilização de tanques, helicópteros e armamentos pesados estejam em franca expansão.
O aumento da violência não está, aparentemente, arrefecendo a disposição de contestação dos revoltosos, mas já está produzindo alguns efeitos. Milhares de pessoas já atravessaram as fronteiras em direção ao Líbano e à Turquia em busca de segurança. A tendência é que esse movimento irá se intensificar nas próximas semanas.
Por último, é no mínimo constrangedor observar a timidez da comunidade internacional frente aos acontecimentos no país. Nesse sentido, o regime de Assad se sente mais seguro e desenvolto para reprimir sua população, sabedor de que encontra-se, pelo menos por enquanto, a salvo de qualquer intervenção em nome dos direitos humanos.
*Professor do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília (UnB) e Pesquisador do CNPq. E-mail: [email protected]