Vestibular
Imperador republicano: o governo de D. Pedro II, quem diria, já fazia referências ao novo regime
José Murilo de Carvalho
Três frases a propósito da monarquia sempre me deram o que pensar. A primeira, ouvi do maior historiador argentino vivo, Tulio Halperin Donghi: ?O império brasileiro foi um luxo?. A segunda foi escrita por outro grande historiador, agora brasileiro, Sérgio Buarque de Holanda, no último volume da História Geral da Civilização Brasileira, por ele organizada: ?O império dos fazendeiros (...) só começa no Brasil com a queda do Império?. A terceira foram as várias declarações de norte-americanos quando da viagem do imperador aos Estados Unidos exaltando seu republicanismo e seu ianquismo. A essas últimas poderiam ser acrescentadas as de outros estrangeiros, como o presidente da Venezuela Rojas Paúl e o poeta cubano Julian del Casal. O primeiro comentou ao ficar sabendo da queda do Império: ?Foi-se a única República da América?; o segundo colocou na boca do imperador a frase ?fui seu [do Brasil] primeiro republicano?.
São afirmações de pessoas insuspeitas que contradizem boa parte da historiografia brasileira sobre o Império e o imperador. Para esta última, o Império era o governo dos fazendeiros e donos de escravos, o imperador ou era déspota dos anos de 1860 ou o Pedro Banana da última década do século. Na contracorrente, Tulio Halperin Donghi fazia uma comparação entre o Brasil e os outros países latino-americanos no século XIX, pensando sobretudo na estabilidade política e no funcionamento regular das instituições representativas. Sérgio Buarque se referia ao não alinhamento do Estado imperial aos proprietários rurais. Os norte-americanos e outros, ao igualitarismo, ao despojamento, ao espírito público do imperador. Os que chamavam o Império de República pensavam, sobretudo, na liberdade de expressão existente no país.
Parte das características que distinguiam o Brasil dos vizinhos, como a unidade nacional e o grau mais atenuado de disputa pelo poder, dependia do parlamentarismo monárquico, por mais imperfeita que fosse sua execução, que D. Pedro II já encontrou a caminho da consolidação. Pode-se perguntar o que dependeu de sua ação e qual a consequência dela para o futuro do país.
O comportamento político do monarca foi marcado pelo escrupuloso cumprimento da Constituição e das leis, pelo respeito não menos escrupuloso ao dinheiro público, pela garantia da liberdade de expressão. Além de respeitar as leis, teve que levar em conta os grupos que controlavam a economia do país. Serviu como árbitro político entre esses grupos, intervindo em temas cruciais como a escravidão de maneira decidida, mas, para muitos, como Nabuco, demasiadamente lenta e cuidadosa. Não foi um absolutista, mas também não foi um político audacioso como o pai, apesar de governar sob uma Constituição presidencialista. Seu governo deixou uma tradição de valorização das instituições que, apesar de quebrada pelo golpe republicano, foi recuperada na Primeira República e talvez esteja viva até hoje, e legou um padrão de comportamento político que também sobreviveu nas primeiras décadas republicanas.
O que menos sobrevive hoje são os valores e atitudes republicanos. Na raiz deste retrocesso talvez esteja uma das falhas do sistema imperial, herdada pela Primeira República: a incapacidade de, depois de garantir a sobrevivência do Estado Nacional, promover a expansão da cidadania política. A elite política se manteve limitada e fechada, e o povo só foi entrar de fato no sistema político depois do Estado Novo. O caráter tardio e rápido da absorção do povo e da ampliação da elite, agravado pelos anos de ditadura, inviabilizou a transmissão de comportamentos e valores. O apelo à republicanização, feito várias vezes ao longo da história do regime, e essencial para garantir sua democratização, pode ter ainda hoje, como uma de suas referências, o exemplo de Pedro II. Republicanizando-se, o regime completará a herança imperial unindo República e democracia, e realizará, até onde isso é possível, a tarefa de construção nacional.
José Murilo de Carvalho é professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro e autor de Os bestializados (Companhia das Letras, 1987) e de A formação das almas (Companhia das Letras, 2002).
Disponível em Revista de História
-
Exercícios Era Vargas
1) (Fac. Med. Marília-SP)- De profundos reflexos no desenvolvimento da história política do Brasil, existe um episódio conhecido pelo nome de Plano Cohen que consiste: a) na coligação de forças imperialistas que visavam impedir a proclamação...
-
Proclamação Da República Questões Vestibular
Proclamação da República O movimento Proclamação da República consiste quando o Brasil deixa de ser imperial e passa a ser República Federativa.O seu dia foi 15 de novembro de 1889 feita por Marechal Deodoro da Fonseca,...
-
Golpe Da Maioridade No Brasil
Golpe da maioridade Foi a partir do ano de 1835 que surgiu entre os políticos da Corte a idéia de D. Pedro II assumir o trono antes dos 18 anos. Os donos de escravos e de terras estavam apreensivos com a implantação da descentralização ? sistema político...
-
Período Regencial Resumo
Período regencial Com a abdicação de D. Pedro I, considerando o fato do príncipe herdeiro ter apenas 5 anos de idade, era necessária, segundo a Constituição, a eleição de três membros pela Assembléia Geral (Senado e Câmara dos Deputados),...
-
Constituição De 1824 Caracteristicas Principais
Artigo sobre a constituição de 1824 com questões de vestibular para um melhor aprendizado.Constituição de 1824Após a dissolução da Assembléia Constituinte, Dom Pedro I, justificando seu ato, declarou que convocaria uma outra Assembléia...
Vestibular